A decisão, assinada pelo conselheiro Maurício Requião de Mello e Silva, reconhece a gravidade da situação criada pela rescisão unilateral e abrupta de contratos firmados em 2022 e 2024, que garantiam atendimento a mais de duas mil crianças em instituições privadas de ensino infantil. O rompimento, segundo o MPC, descumpriu sentença judicial transitada em julgado que obrigava o município a eliminar o déficit de vagas em creches e pré-escolas.
O quadro é alarmante: conforme apurado pelo órgão de controle, 1.729 crianças estão sem atendimento na rede municipal em 2025 – número que o próprio Ministério Público de Contas estima já ter subido para 1.860. O Tribunal entendeu que a atitude da atual gestão violou o direito fundamental à educação, previsto na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Indícios de favorecimento e gestão contraditória
O despacho aponta ainda indícios de favorecimento e direcionamento em um chamamento público aberto após o rompimento dos contratos. O processo nº 04/2025 teve apenas uma participante: a Associação de Proteção à Maternidade e à Infância (APMI), entidade que alterou seu estatuto em janeiro deste ano sob a presidência de Fábio Bernardo, então chefe de gabinete do prefeito. O fato, para o TCE, reforça “ausência de planejamento, contradição administrativa e possível direcionamento”, em afronta aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade.
Medidas impostas pelo Tribunal
Atendendo ao pedido do MPC-PR, o Tribunal determinou que o município adote, em até 15 dias úteis, providências emergenciais para garantir a matrícula e o atendimento integral das crianças de até 5 anos que estão desassistidas.
O prefeito também deverá, no prazo máximo de 30 dias, apresentar um plano emergencial detalhado de recomposição da rede de ensino infantil, com metas, cronograma, fontes de recursos e forma de execução.
O TCE ainda ordenou a realização de inspeção in loco, a cargo da Coordenadoria de Acompanhamento de Atos de Gestão (CAGE), para verificar a real situação das creches e escolas municipais – inclusive a estrutura física, número de profissionais, regularidade de contratações e parcerias com entidades privadas.
Além disso, o município terá que garantir na Lei Orçamentária de 2026 recursos específicos e suficientes para manutenção das vagas da educação infantil, em valor não inferior ao executado nos 12 meses anteriores, devidamente atualizado.
Risco de Tomada de Contas Extraordinária
O conselheiro Maurício Requião deixou aberta a possibilidade de instaurar uma Tomada de Contas Extraordinária para apurar a atuação da APMI e do chefe de gabinete do prefeito na alteração do estatuto da entidade – o que pode agravar a situação da atual gestão perante o órgão de controle.
A decisão foi emitida no último dia 3 de outubro e marca mais um capítulo de desgaste para o governo Carlos de Paula, que já enfrenta críticas pela condução da política educacional em Sarandi. O TCE classificou o cenário como violação direta ao dever constitucional do município e enfatizou o impacto “irreparável” da exclusão de centenas de crianças do acesso à educação infantil.
O que diz a prefeitura?
Nada. Procurada pela reportagem, a Prefeitura não se manifestou.